quarta-feira, 25 de abril de 2012

A linguagem no mundo da fé (escritos de Roger Lenaers)

A linguagem é apropriada?

  " Mas, por que queremos partilhar com os outros o que pensamos, sentimos ou queremos? Para nos vincularmos mais a eles.Afinal, temos uma necessidade natural de fazê-lo: sem os outros já não somos os mesmos. E, além disso, precisamos ser confirmados ou corrigidos mediante sua reação (por meio da mesma linguagem) para poder profredir, e para estimular os outros a fazê-lo. A linguagem também tem a função de ajudar no nascimento daquilo que ainda está informe e obscuro no sujeito, para configurá-lo e trazê-lo á luz, de tal maneira que este assuma sua própria interioridade.

  Ao longo dos séculos, o grupo cultural cristão ocidental desenvolveu sua própria estética para expressar o que pensava e sentia coletivamente. Isso quer dizer que construiu sua própria linguagem, tanto no sentido estrito como no amplo, formulou leis e confissões, criou rituais e os tronou obrigatórios, edificou e equipou monastérios e igrejas. Por meio de figuras e cores deu forma a sua esperanças, expectativas, imaginações, medos,alegrias,dúvidas conscientes ou inconscientes. Porém, a seguir ocorreu algo assombroso. Aquela linguagem que durante mil anos todos compreendiam no Ocidente transformou-se, pouco a pouco, num idioma estrangeiro, uma língua morta, compreensível somente para aqueles que foram previamente educados nela.

(...) cada linguagem, inclusive a cristã, está ligada a sua época.A linguagem cristã teve origem numa fase cultural bem determinada e ainda conserva sinais dela. Serviu para expressar as experiências e representações de um grupo, pequeno em seus inícios, que em sua bsuca da realidade transcendente de e"Deus" se deixou inspirar e guiar pela figura messiânica de Jesus de Nazaré. A linguagem desse pequeno grupo do século I se estendeu pouco a pouco...

(...) as representações usadas pela Igreja em sua pregação, sua imagem do mundo e da humanidade, assim como a própria imagem de Deus,permaneceram na idade Média, enquanto a sociedade ocidental se distancia daquela época a uma velocidade cada vez maior. Quem pensa e sente como na Idade Média, fala assim também. Essa linguagem (usada em missas, pregações) se tornou um idioma "estrangeiro" como era até pouco tempo o latim eclesiástico.

Os fiéis de pensamente moderno tampouco teriam razão se esperassem que a imprescindível renovação de nosso mundo da fé viesse exclusivamente, ou em primeiro lugar,do melhoramento e da adaptação da linguagem,ou seja, das estruturas, formas, tradições e uso eclesiásticos.

Se a linguagem tradicional deixou de ser útil,isso ocorre não porque tenha erros ou seja pouco clara, e sim porque encarna correta e claramente representações atualmente superadas, que a modernidade depositou no sumidouro do passado."

LENAERS,Roger. Outro Cristianismo é possível. Paulus: São Paulo, 2011.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...