quarta-feira, 29 de junho de 2011

Um dia no Haiti

Oração da tarde


Neste momento partilhamos com vocês a oração de um só dia trabalho.

Um só dia de trabalho é suficiente para o corpo solicitar aos olhos a passagem das dores através das lágrimas, na esperança de no dia seguinte ter a força para continuar indo ao encontro dos marginalizados.

Ao chegarmos ao local de trabalho (uma das áreas de 30 mil tendas – corail, uma criança de 10 anos veio ao nosso encontro convidar-nos a ir visitar sua família. Ao entramos em sua pequena casa feita de madeira (miniatura), encontramos seu pai muito doente e dizer para nós: ‚sinto dores profundas no estomago, ele se cola. Sinto que ele toca um lado no outro causando dores fortíssimas, pois, não temos o que comer desde muito tempo‛.

Ao ouvirmos o relato vimos e sentimos Jesus sendo preso, sendo crucificado, em poucos dias morto e jogado entre o lixo sem uma verônica para enxugar o seu rosto, sem um Cirineu para ajudar a carregar sua cruz, sem um José de Arimateia para pedir o seu corpo e retirá-lo da cruz, envolvê-lo em pano de linho e dá-lhe uma sepultura digna.

Em outra área de trabalho, a Irmã partilha sua experiência, ela conta: ‚não fui capaz de presenciar uma mãe chegar com sua criança de aproximadamente um aninho envolvida em um pana, colocá-lo sobre o lixão cavar com um facão o lixo e lá colocar o corpo do seu filhinho que havia morrido pela falta de alimentação, higiene, habitação, assistência médica e enterrado sem nenhuma dignidade humana‛.

Este, foi mais um cidadão haisiene que nunca foi visto e nunca será contada por suas autoridades políticas e eclesiásticas”.

Ainda em uma das áreas de tendas, uma mãe entra com três crianças, duas dela e uma da vizinha e diz: ‚meus filhos já não tem mais vontade de comer, faço a comida e eles dizem ‘não tenho fome’, vão a escola e não guardam nada que fala o professor . Eles não tem ‘memória’”. Outra mãe entra com uma pré-adolescente e diz ‚ela não tem cabeça, nada do que fala o professor é por ela compreendido, peço-lhe para ir comprar um objeto, volta mais de uma vez para perguntar o que lhe mandei comprar e ás vazes volta ainda sem o objeto que lhe pedi‛. Fala à adolescente: ‚sinto muita dor de cabeça, dói meu estomago, varias vezes sai sangue do meu nariz, sinto tontura e perco visão‛.

Outra criança de nove anos diz “Drª em Nova York tem comida? Então eu quero ir para lá, Drª não consigo mais pensar, não tenho mais cabeça, ouço o professor mas não entendo o que ele fala, por isso não quero mais estudar, quero ir para Nova York

doutora‛. Outra criança de seis anos de idade, depois de 10 minutos de silêncio, a interrompi perguntando:

– o que pensa?

Ela respondeu-me,

- ‚em uma pessoa, ela está muito longe‛.

– quem é esta pessoa?

- ‚Ela é meu pai, vivo com uma mulher, não sei se ela vai dar comida prá gente hoje. Dormi sem comer, acordei e fui à escola e agora o professor mandou vim me consultar‛.

Já era treze horas e trinta minutos (13:30hs) quando foi atendida a mais pequena cidadã haisiene, que também não sabe o dia que vai aparecer alguma coisa para comer e vive sempre na incerteza, tão pequena e já experimenta a dor profunda da injustiça da concentração de renda, da desumanidade.

A cada relato ouvi e vi Jesus pregado na cruz dizer: “Pai, Pai por que me abandonaste”?

Passando pelo centro da capital Port-au-Prince presenciamos locais onde se faz comida, tipo cozinha popular, no mesmo local realiza-se o abate de animais, o espaço era totalmente coberto de lixo, lama, esgoto, todo tipo de sujeira, a mesa para o corte da carne era o chão coberto de lixo e lama espalhada na rua.

Outra dupla de irmãs que na volta das atividades encontram mulheres e idosos suplicando trabalho e/ou comida, pois, já não suportam mais a dor da fome. Aqui partilhamos o grito de Raquel que não quer mais ser consolada, pois, seus filhos já não existem mais.

Outra dupla partilha as ressonâncias de uma dinâmica feita num grupo de formação. Dinâmica: o que você faria ou diria a Jesus se ele entrasse nesta sala agora? A maioria das pessoas disseram que iriam embora com Jesus, pois, a vida aqui é muito sofrida e elas não vem mais saídas, a única é sair desta realidade.

A oração é para nós o momento onde partilhamos as experiências do dia, aqui as lagrimas não são contidas mais elevadas em forma de preces a Deus para receber forças e luzes para o dia seguinte.

Comunidade brasileira missionária no Haiti.

Pela comunidade

Ir. Marcelina.

Port-au-prince, 16 de maio 2011

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