quinta-feira, 30 de junho de 2011

Escutar (com) os pés


“Conhece-se a Deus pelos pés”
(Carlos Mesters)
Atos 3,1-10: Pedro e João iam diariamente ao templo; um homem, coxo de nascença, posta-se junto à
porta do templo de Jerusalém. É um ponto estratégico.
Em lugar de caminhar, assiste os caminheiros. Aprendeu a aproveitar-se deles, pedindo esmolas.
Nem Pedro e João escapam. Às palavras de Pedro, reage dando um salto. Lucas relata que “no mesmo instante os pés e os tornozelos do homem ficaram firmes; de um salto ficou de pé e começou a andar. Entrou com eles no Templo, andando, saltando e louvando a Deus” (v. 7-8).
Salta para um novo caminhar, salta ainda mais para um novo ser. Salta da vida sem graça, limitada a pedinte da margem da porta do templo, para a graça da vida de caminheiro solidário.
Eis a missão do cristão: ajudar as pessoas a se colocarem de pé, resgatando-as em sua dignidade para serem capazes de andar pelos seus próprios pés.
Não cabe ao cristão carregar as pessoas com seu paternalismo. Antes, sua missão é vê-las maduras, entrando por seus próprios pés na presença de Deus.
A existência humana pode ser petrificação, sonolência, estagnação, medo, repetição, inércia e fixismo. Mas ela pode ser conduzida também com sabedoria e imaginação. O movimento criador pode superar o maras-mo e a acomodação; nosso interior contém potencial para vencer a inércia e superar o medo do desco-nhecido, do fracasso, da desilusão... Carregamos sonhos e desejos, mas podemos correr o risco de con-vertê-los em uma contínua espera, em algo parado que não se materializa.
Há um momento em que, para alcançá-los, temos que saltar; saltar é humanizador e plenificante.
O salto autêntico reclama coragem àquele que está prostrado; de tempos em tempos precisamos de saltos que nos ajudem a superar o medo e nos garantir a autonomia e a construção de nossa própria história.
O salto original gera o crescimento da humanidade. É salto que ama as pessoas, que ergue os fracos, que promove a justiça, que preserva a paz, que semeia a esperança, que respeita o diferente, que congrega povos, que dinamiza os talentos pessoais, salto que valoriza compromissos.
É importante descobrir o real significado do salto que nos arranca do passado paralisante e nos lança na aventura que modela a vida pessoal, social, ética, religiosa, histórica...
O salto inteligente estimula a criatividade e rejeita a mediocridade.
Para isto, devemos suscitar e cultivar o legítimo “salto”, que é fenômeno inovador e fecundo. Isso impli-ca pisar o solo com a confiança de que sabemos que a vida está cheia de novas possibilidades, de metas que ainda não superamos, de encontros que ainda não se realizaram, de chamados aos quais ainda não respondemos, de compromissos ainda não assumidos...
Construir a vida que queremos implica saber saltar, saber partir e deixar para trás nossa situação de comodidade, os lugares cotidianos onde nos movemos como peixe na água, onde nos sentimos seguros. Há um impulso interior que nos convida a saltar, do conhecido ao novo: um novo projeto, um novo compromisso, uma nova missão. Isso implica momentos de risco, mas também ali está a serena confiança de que podemos e queremos saltar. Não no vazio, mas no encontro.
É importante ter clareza da direção para onde saltamos. O salto lúcido mantém o olhar vigilante, de discernimento: em que direção saltar? Há saltos equivocados: salto amargo, salto pessimista, salto frustra-do, salto mortal, salto no escuro... O salto infatigável concretiza as aspirações do futuro.
O verdadeiro salto humano envolve a totalidade do ser e tem sentido de inovação. É o salto criativo, da transformação permanente, que acorda o espírito, solta a liberdade, assume a responsabilidade e aponta o destino inédito. Salto é também ruptura; há salto que só se realiza com a quebra da rotina para poder

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Crise terminal do Capitalismo

Tenho sustentado que a crise atual do capitalismo é mais que conjuntural e estrutural. É terminal. Chegou ao fim o gênio do capitalismo de sempre adaptar-se a qualquer circunstância. Estou consciente de que são poucos que representam esta tese. No entanto, duas razões me levam a esta interpretação.

A primeira é a seguinte: a crise é terminal porque todos nós, mas particularmente, o capitalismo, encostamos nos limites da Terra. Ocupamos, depredando, todo o planeta, desfazendo seu sutil equilíbrio e exaurindo excessivamente seus bens e serviços a ponto de ele não conseguir, sozinho, repor o que lhes foi sequestrado. Já nos meados do século XIX Karl Marx escreveu profeticamente que a tendência do capital ia na direção de destruir as duas fontes de sua riqueza e reprodução: a natureza e o trabalho. É o que está ocorrendo.

A natureza, efetivamente, se encontra sob grave estresse, como nunca esteve antes, pelo menos no último século, abstraindo das 15 grandes dizimações que conheceu em sua história de mais de quatro bilhões de anos. Os eventos extremos verificáveis em todas as regiões e as mudanças climáticas tendendo a um crescente aquecimento global falam em favor da tese de Marx. Como o capitalismo vai se reproduzir sem a natureza? Deu com a cara num limite intransponível.

O trabalho está sendo por ele precarizado ou prescindido. Há grande desenvolvimento sem trabalho. O aparelho produtivo informatizado e robotizado produz mais e melhor, com quase nenhum trabalho. A consequência direta é o desemprego estrutural.

Milhões nunca mais vão ingressar no mundo do trabalho, sequer no exército de reserva. O trabalho, da dependência do capital, passou à prescindência. Na Espanha o desemprego atinge 20% no geral e 40% e entre os jovens. Em Portugal 12% no país e 30% entre os jovens. Isso significa grave crise social, assolando neste momento a Grécia. Sacrifica-se toda uma sociedade em nome de uma economia, feita não para atender as demandas humanas, mas para pagar a dívida com bancos e com o sistema financeiro. Marx tem razão: o trabalho explorado já não é mais fonte de riqueza. É a máquina.

A segunda razão está ligada à crise humanitária que o capitalismo está gerando. Antes se restringia aos países periféricos. Hoje é global e atingiu os países centrais. Não se pode resolver a questão econômica desmontando a sociedade. As vítimas, entrelaças por novas avenidas de comunicação, resistem, se rebelam e ameaçam a ordem vigente. Mais e mais pessoas, especialmente jovens, não estão aceitando a lógica perversa da economia política capitalista: a ditadura das finanças que via mercado submete os Estados aos seus interesses e o rentismo dos capitais especulativos que circulam de bolsas em bolsas, auferindo ganhos sem produzir absolutamente nada a não ser mais dinheiro para seus rentistas.

Mas foi o próprio sistema do capital que criou o veneno que o pode matar: ao exigir dos trabalhadores uma formação técnica cada vez mais aprimorada para estar à altura do crescimento acelerado e de maior competitividade, involuntariamente criou pessoas que pensam. Estas, lentamente, vão descobrindo a perversidade do sistema que esfola as pessoas em nome da acumulação meramente material, que se mostra sem coração ao exigir mais e mais eficiência a ponto de levar os trabalhadores ao estresse profundo, ao desespero e, não raro, ao suicídio, como ocorre em vários países e também no Brasil.

As ruas de vários países europeus e árabes, os "indignados” que enchem as praças de Espanha e da Grécia são manifestação de revolta contra o sistema político vigente a reboque do mercado e da lógica do capital. Os jovens espanhóis gritam: "não é crise, é ladroagem”. Os ladrões estão refestelados em Wall Street, no FMI e no Banco Central Europeu, quer dizer, são os sumossacerdotes do capital globalizado e explorador.

Ao agravar-se a crise, crescerão as multidões, pelo mundo afora, que não aguentam mais as consequências da superexploracão de suas vidas e da vida da Terra e se rebelam contra este sistema econômico que faz o que bem entende e que agora agoniza, não por envelhecimento, mas por força do veneno e das contradições que criou, castigando a Mãe Terra e penalizando a vida de seus filhos e filhas.

Texto:Leonardo Boff
(Enviado pela amiga Lindalva Macedo)

Um dia no Haiti

Oração da tarde


Neste momento partilhamos com vocês a oração de um só dia trabalho.

Um só dia de trabalho é suficiente para o corpo solicitar aos olhos a passagem das dores através das lágrimas, na esperança de no dia seguinte ter a força para continuar indo ao encontro dos marginalizados.

Ao chegarmos ao local de trabalho (uma das áreas de 30 mil tendas – corail, uma criança de 10 anos veio ao nosso encontro convidar-nos a ir visitar sua família. Ao entramos em sua pequena casa feita de madeira (miniatura), encontramos seu pai muito doente e dizer para nós: ‚sinto dores profundas no estomago, ele se cola. Sinto que ele toca um lado no outro causando dores fortíssimas, pois, não temos o que comer desde muito tempo‛.

Ao ouvirmos o relato vimos e sentimos Jesus sendo preso, sendo crucificado, em poucos dias morto e jogado entre o lixo sem uma verônica para enxugar o seu rosto, sem um Cirineu para ajudar a carregar sua cruz, sem um José de Arimateia para pedir o seu corpo e retirá-lo da cruz, envolvê-lo em pano de linho e dá-lhe uma sepultura digna.

Em outra área de trabalho, a Irmã partilha sua experiência, ela conta: ‚não fui capaz de presenciar uma mãe chegar com sua criança de aproximadamente um aninho envolvida em um pana, colocá-lo sobre o lixão cavar com um facão o lixo e lá colocar o corpo do seu filhinho que havia morrido pela falta de alimentação, higiene, habitação, assistência médica e enterrado sem nenhuma dignidade humana‛.

Este, foi mais um cidadão haisiene que nunca foi visto e nunca será contada por suas autoridades políticas e eclesiásticas”.

Ainda em uma das áreas de tendas, uma mãe entra com três crianças, duas dela e uma da vizinha e diz: ‚meus filhos já não tem mais vontade de comer, faço a comida e eles dizem ‘não tenho fome’, vão a escola e não guardam nada que fala o professor . Eles não tem ‘memória’”. Outra mãe entra com uma pré-adolescente e diz ‚ela não tem cabeça, nada do que fala o professor é por ela compreendido, peço-lhe para ir comprar um objeto, volta mais de uma vez para perguntar o que lhe mandei comprar e ás vazes volta ainda sem o objeto que lhe pedi‛. Fala à adolescente: ‚sinto muita dor de cabeça, dói meu estomago, varias vezes sai sangue do meu nariz, sinto tontura e perco visão‛.

Outra criança de nove anos diz “Drª em Nova York tem comida? Então eu quero ir para lá, Drª não consigo mais pensar, não tenho mais cabeça, ouço o professor mas não entendo o que ele fala, por isso não quero mais estudar, quero ir para Nova York

doutora‛. Outra criança de seis anos de idade, depois de 10 minutos de silêncio, a interrompi perguntando:

– o que pensa?

Ela respondeu-me,

- ‚em uma pessoa, ela está muito longe‛.

– quem é esta pessoa?

- ‚Ela é meu pai, vivo com uma mulher, não sei se ela vai dar comida prá gente hoje. Dormi sem comer, acordei e fui à escola e agora o professor mandou vim me consultar‛.

Já era treze horas e trinta minutos (13:30hs) quando foi atendida a mais pequena cidadã haisiene, que também não sabe o dia que vai aparecer alguma coisa para comer e vive sempre na incerteza, tão pequena e já experimenta a dor profunda da injustiça da concentração de renda, da desumanidade.

A cada relato ouvi e vi Jesus pregado na cruz dizer: “Pai, Pai por que me abandonaste”?

Passando pelo centro da capital Port-au-Prince presenciamos locais onde se faz comida, tipo cozinha popular, no mesmo local realiza-se o abate de animais, o espaço era totalmente coberto de lixo, lama, esgoto, todo tipo de sujeira, a mesa para o corte da carne era o chão coberto de lixo e lama espalhada na rua.

Outra dupla de irmãs que na volta das atividades encontram mulheres e idosos suplicando trabalho e/ou comida, pois, já não suportam mais a dor da fome. Aqui partilhamos o grito de Raquel que não quer mais ser consolada, pois, seus filhos já não existem mais.

Outra dupla partilha as ressonâncias de uma dinâmica feita num grupo de formação. Dinâmica: o que você faria ou diria a Jesus se ele entrasse nesta sala agora? A maioria das pessoas disseram que iriam embora com Jesus, pois, a vida aqui é muito sofrida e elas não vem mais saídas, a única é sair desta realidade.

A oração é para nós o momento onde partilhamos as experiências do dia, aqui as lagrimas não são contidas mais elevadas em forma de preces a Deus para receber forças e luzes para o dia seguinte.

Comunidade brasileira missionária no Haiti.

Pela comunidade

Ir. Marcelina.

Port-au-prince, 16 de maio 2011

Vitória de Palmares


Só Mandacaru resistiu... resiste e... celebra!

Celebramos, com ação de graças, esta vitória, ainda que parcial, do povo de Palmares!

Continuamos torcendo e rezando para que todas as famílias sejam atendidas no direito, tão básico, à moradia digna!

A luta continua!

Continuamos em comunhão!

Desejamos encontrá-las bem!

Aqui estamos bem, já em clima junino: festa, fogueira e arrasta pé.

Estamos felizes porque, das 84 famílias que estavam abrigadas nas barracas, 52 estão fazendo a mudança para a casa nova. Foi uma emoção tão grande ao ver o sofrimento desta famílias amenizado! Pena que não foram todas! Mas esperamos que na próxima remessa de entrega de casas elas sejam contempladas.


Dia18, foi um ano da grande enchente. Continuaremos acompanhando as famílias com nossas visitas, tanto as que estão nas casas como as que continuam nas barracas.

Agora vamos ter um tempo de festejos, onde para tudo, só festa que faz parte da vida do povo e nós com eles!

Beijos com carinho,

Irmãs Marisa e Sandra

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Casa Arrumada - Poema Carlos Drummond



Casa arrumada é assim:
Um lugar organizado, limpo, com espaço livre pra circulação e uma boa entrada de luz.

Mas casa, pra mim, tem que ser casa e não um centro cirúrgico, um cenário de novela.

Tem gente que gasta muito tempo limpando, esterilizando, ajeitando os móveis, afofando as almofadas…
Não, eu prefiro viver numa casa onde eu bato o olho e percebo logo:
Aqui tem vida…

Casa com vida, pra mim, é aquela em que os livros saem das prateleiras e os enfeites brincam de trocar de lugar.

Casa com vida tem fogão gasto pelo uso, pelo abuso das refeições fartas, que chamam todo mundo pra mesa da cozinha.
Sofá sem mancha?
Tapete sem fio puxado?
Mesa sem marca de copo?
Tá na cara que é casa sem festa.

E se o piso não tem arranhão, é porque ali ninguém dança.
Casa com vida, pra mim, tem banheiro com vapor perfumado no meio da tarde.

Tem gaveta de entulho, daquelas que a gente guarda barbante, passaporte e vela de aniversário, tudo junto…
Casa com vida é aquela em que a gente entra e se sente bem-vinda.

A que está sempre pronta pros amigos, filhos…
Netos, pros vizinhos…
E nos quartos, se possível, tem lençóis revirados por gente que brinca ou namora a qualquer hora do dia.

Casa com vida é aquela que a gente arruma pra ficar com a cara da gente.
Arrume a sua casa todos os dias…

Mas arrume de um jeito que lhe sobre tempo pra viver nela…
E reconhecer nela o seu lugar.

Enviado como colaboração da nossa amiga francisclariana Lindalva Macedo, para reflexão

Eucaristia: comungar com toda a vida



Frei Betto


Eucaristia significa "ação de graças". É o sacramento central da vida cristã. Entre os fiéis, não se costuma dizer: "Fiz a primeira eucaristia". O habitual é: "Fiz a primeira comunhão". Quem vai à missa diz: "Vou comungar". Quase nunca fala: "Vou receber a eucaristia".

Comunhão - eis uma palavra abençoada. Expressa bem o que a eucaristia significa. Comunhão vem da mesma raiz que a palavra comunicar. Se comungo as mesmas ideias de uma pessoa é porque sinto profunda afinidade. Ela diz o que penso e exprime o que sinto. Na eucaristia comungamos: (1) com Jesus; (2) com os nossos semelhantes; (3) com a natureza; e (4) com a Criação divina.

Jesus instituiu a eucaristia em vários momentos de sua vida. O mais significativo deles foi a Última Ceia, quando tomou o pão, repartiu entre seus discípulos e disse: "Tomai e comei, pois isto é o meu corpo". A partir daquele momento, todas as vezes que uma comunidade cristã reparte entre si o pão e o vinho, abençoados pelo sacerdote, é o corpo e o sangue de Jesus que ela está compartindo. A palavra "companheiro" significa "compartir o pão". Na eucaristia, compartimos mais do que o pão; é a própria vida de Jesus que nos é ofertada em alimento para a vida terna, deste lado, e eterna, do outro.

Ao receber a hóstia consagrada - pão sem fermento - os cristãos comungam a presença viva de Jesus eucarístico. Nossa vida recebe a vida dele que nos revigora e fortalece. Tornamo-nos um com ele ("…que todos sejam um" (João 17,21).

Ao instituir a eucaristia na Última Ceia, Jesus concluiu: "Fazei isto em minha memória". Fazer o quê? A missa? A consagração? Sim, mas não apenas isso. Fazer memória é sinônimo de comemorar, rememorar juntos. Ao comemorar os 500 anos da invasão portuguesa, o Brasil deveria ter feito memória do que, de fato, ocorreu: genocídio indígena, tráfico de escravos, exclusão dos sem-terra etc.

Fazer algo em memória de Jesus não é, portanto, apenas recordar o que ele fez há dois mil anos. É reviver em nossas vidas o que ele viveu, assumindo os valores evangélicos, dispostos a dar o nosso sangue e a nossa carne para que outros tenham vida. Quem não se dispõe a dar a vida por aqueles que estão privados de acesso a ela, não deveria se sentir no direito de aproximar-se da mesa eucarística. Só há comunhão com Jesus se houver compromisso de justiça com os mais pobres, "pois quem não ama seu irmão, a quem vê, não poderá amar a Deus, a quem não vê" (I João 4,20).

A vida é o dom maior de Deus. "Vim para que todos tenham vida e vida em plenitude" (João 10,10). Não foi em vão que Jesus quis perpetuar-se entre nós naquilo que há de mais essencial à manutenção da vida humana: a comida e a bebida, o pão e o vinho. O pão é o mais elementar e universal de todos os alimentos. O vinho era bebida de festa e liturgia no tempo de Jesus. De certo modo, o pão simboliza a vida cotidiana e, o vinho, aqueles momentos de profunda felicidade que nos faz sentir que vale a pena estar vivos.

No entanto, há milhões de pessoas que, ainda hoje, não têm acesso à comida e à bebida. O maior escândalo deste início de século e de milênio é a existência de pelo menos 1 bilhão de famintos entre os 6,5 bilhões de habitantes da Terra. Só no Brasil, 30 milhões estão excluídos dos bens essenciais à vida. E inúmeras pessoas trabalham de sol a sol para assegurar o pão de cada dia. Em toda a América Latina morrem de fome, a cada ano, cerca de 1 milhão de crianças com menos de 5 anos de idade.

A fome mata mais que a aids. No entanto, a aids mobiliza campanhas milionárias e pesquisas científicas caríssimas. Por que não há o mesmo empenho no combate à fome? Por uma simples razão: a aids não faz distinção de classe social, contamina pobres e ricos. A fome, porém, só afeta os pobres.

Não se pode comungar com Jesus sem comungar com os que foram criados à imagem e semelhança de Deus. Fazer memória de Jesus é fazer com que o pão (símbolo de todos os bens que trazem vida) seja repartido entre todos. Hoje, o pão é injustamente distribuído entre a população mundial. Basta dizer que 80% dos bens industrializados produzidos no mundo são absorvidos por apenas 20% de sua população. Ou seja, se toda a riqueza da terra fosse um bolo dividido em 100 fatias, 1 bilhão e 600 milhões de pessoas ficariam com 80 fatias. E as 20 fatias restantes teriam de ser repartidas para matar a fome de 4 bilhões e 900 milhões. Basta dizer que apenas 4 homens, todos dos EUA, possuem uma fortuna pessoal superior à riqueza somada de 42 nações subdesenvolvidas, que abrigam cerca de 600 milhões de pessoas!

Jesus deixou claro que, comungar com ele, é comungar com o próximo, sobretudo com os mais pobres. No "Pai Nosso" ensinou-nos uma oração com dois refrões, "Pai Nosso" e "pão nosso".

Não posso chamar Deus de "Pai" e de "nosso" se quero que o pão (os bens da vida) seja só meu. Portanto, quem acumula riquezas, arrancando o pão da boca do pobre, não deveria sentir-se no direito de se aproximar da eucaristia.

No capítulo 25, 31-44 de Mateus, Jesus enfatiza que a salvação se sujeita ao serviço libertador aos excluídos, com quem ele se identifica. E na partilha dos pães e peixes, episódio conhecido como “multiplicação dos pães”, Jesus ressalta a socialização dos bens da vida como sinal da presença libertadora de Deus.

Parte de outro texto

" Trazemos em nosso corpo 15 bilhões de anos da história ou da evolução do Universo. Os átomos de nosso corpo já foram mares e vulcões, águias e serpentes, carvalhos e rosas (experimente olhar uma criança de rua consciente de que ela traz,em si, 15 bilhões de anos!). Toda a Criação está pois entrelaçada, formando uma única malha. Tudo que existe, préexiste e subsiste. Daí falarmos em Universo, e não em Pluriverso. Essa unidade faz o Cosmo - termo grego que significa " belo", e está na raiz da palavra cosmético, aquilo que traz beleza.

Nosso corpo e a Terra têm a mesma proporção de água: 70%. Como a Terra, nosso corpo possui as mesmas protuberâncias e grutas, ondulações e sistemas de irrigação, e até matas em forma de pêlos que protegem a fonte de vida. Somos filhos da Terra...

Já reparou que a nossa vida é uma respiração boca-a-boca com a natureza? Do nascimento à morte jamais deixamos de respirar. Morreríamos se não absorvessemos o oxigênio que nos é fornecido pelas plantas e algas dos oceanos. Contaminados estes a vida na Terra desaparecerá. E quando expiramos, soltamos ar pelas narinas e pela boca, devolvendo gás carbônico à natureza. As plantas e os planctons nutrem-se de gás carbônico. Eis a respiração boca-a-boca.

Viver é um movimento eucarístico

Vejamos outra dimensão eucarística de nossa relação com a natureza. Impossível viver sem comida e bebida. Toda comida é uma vida que morreu para nos dar vida. O arroz que comemos no almoço é um cereal que morreu para nos dar vida... No ato de nutrição há um caráter eucarístico. Comer é comungar. Em suma viver é um movimento eucarístico.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Corpus Cristi


ESPIRITUALIDADE DO CORPO

“Jesus: CORPO de Deus entre nós, CORPO que se dá aos homens, CORPO para os corpos, como carne e sangue, pão e vinho. E o CORPO de Deus, Jesus Cristo, se expande, incha, tomando o universo inteiro...

É bem aí, no CORPO, que Deus e o homem se encontram.

A humanidade de Deus nos incomoda. Coisa que os primeiros cristãos descobriram com espanto.

Eles entenderam que para falar de Deus é necessário deixar de falar de Deus, e falar sobre um homem, um rosto, uma vida... Foi então que eles ficaram cristãos.

Deus, para falar de si, tornou-se homem. Fala sobre Deus é fala sobre um homem.

A PALAVRA se fez CARNE. Nosso irmão. Um de nós. Nasceu, viveu, morreu... ressuscitou” (Rubem Alves)

“A festa de Corpus Christi quer nos fazer recordar que CORPO é cálice, onde se bebe o vinho da alegria e da salvação, inserido no CORPO místico e cósmico de Cristo. Só haverá futuro digno quando todos os CORPOS viverem em comunhão, saciados da fome de pão e de beleza” ( Frei Betto).

Celebramos o “Corpo de Cristo”, uma das festas mais ricas que nos faz pensar em seu conteúdo e sim-bolismo, mas que nos faz pensar também neste “Corpo de Cristo” no meio de tantos outros corpos.

Aceitamos, pela fé, a presença real de Cristo na Eucaristia; isso implica comunhão bem maior com sua vida, seu testemunho de amor, de partilha, solidariedade, dedicação pela transformação de tudo aquilo que não dignifica a vida ou não dignifica os “corpos”.

Participamos, com muita fé, dedicação e respeito, das celebrações do “Corpo de Cristo”, mas pode ser que, às vezes, façamos uma profunda cisão ou ruptura entre o que celebramos e a realidade que nos cerca, ou seja, os famosos “corpos”: explorados, manipulados, usados, escravizados, destruídos...

Pode ser que, às vezes, tenhamos um profundo amor e respeito pelo “Corpo de Cristo vivo e pre-sente na Eucaristia”, e não o vejamos nos “corpos” que estão aí, aqui, ali, lá, dos nossos lados...

Parece que não sabemos lidar muito bem com esse estranho e (des)conhecido que são os nossos “cor-pos”. Do corpo temos tido suspeitas e o temos olhado com desconfiança.

É preciso estabelecer o diálogo com o corpo. Não se trata apenas de uma reconciliação amistosa, mas de uma descoberta radical. Ignoramos nosso corpo, apesar de tê-lo tão próximo; é preciso dar-nos conta das riquezas que tem, o muito que sabe, a importância do que tem a nos dizer, a necessidade de seu apoio e a sabedoria de sua amizade.

Aqui está nosso melhor amigo, fielmente a nosso lado, e nem sempre o percebemos.

A corporeidade penetra toda a nossa auto-realização como seres humanos. O corpo não é simplesmente “organismo vivo” ou mera “exterioridade” ou mero “instrumento do espírito”. O corpo não é o túmulo da alma, mas o templo do Espírito, o lugar onde o “Verbo se fez carne”.

Por meio da Encarnação e por meio da Ressurreição de Jesus, a carne se converteu em espelho da divindade. Assim, o corpo humano começou a ocupar um lugar central.

O corpo é de importância máxima para a experiência que temos de nós mesmos e para a comunicação com Deus, com os outros e com a natureza.

A consciência do respeito e do valor ao corpo é necessária para a maturidade afetiva. A desvalorização do corpo, por outro lado, resulta na mutilação da expressividade, da comunicação de sentimentos e prejudica a maturidade afetiva-social-espiritual.

Uma relação negativa com a corporeidade equivale a uma relação negativa consigo mesmo, com os outros e até mesmo com Deus. Não aceitar o corpo é atentar contra a vida.

A pessoa é uma totalidade unificada, um “todo espiritual” e um “todo corpóreo”, tanto que não existe fenômeno corpóreo que não tenha um reflexo no espírito, nem experiência espiritual que não se reflita no corpo. O corpo participa, de maneira imprescindível, na atuação do eu espiritual e vice-versa.

A “linguagem espiritual” acompanha a “linguagem corporal”, assim como a linguagem do corpo reforça a linguagem espiritual.

O corpo fala por si mesmo, comunica, reage... O corpo é expressão de nossa masculinidade ou feminilidade, de nossa sexualidade integrada ou reprimida, de nossa saúde ou doença, de nossa alegria ou tristeza, realização ou frustração, de nossa consolação ou desolação.

O corpo é expressão e comunicação daquilo que somos.

O próprio Deus se fez corpo, no corpo de uma mulher: “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós”.

A espiritualidade cristã é “encarnada”.

A Encarnação foi o caminho que a Trindade escolheu para se aproximar da humanidade e fazer história

conosco. Nosso corpo humano, feito de barro – vaso frágil e quebradiço – tornou-se o lugar privilegiado da chegada e da revelação do amor trinitário.

“Não sabeis que o vosso corpo é templo do Espírito Santo, que habita em vós?” (1Cor, 6,19)

O nosso corpo é o “templo” santo e santificado, onde Deus Trino faz sua morada.

A Encarnação de Jesus não autoriza qualquer desprezo da corporeidade; pelo contrário, valoriza o ser humano na sua totalidade (Mc. 2,9-11).

Jesus cura a pessoa toda a começar pelas doenças do corpo, doenças psicológicas e espirituais.

Cultivar o corpo para recuperar a saúde, combater o stres, harmonizar mente e corpo, razão e emoção, isto é benéfico. A deturpação desumanizante do corpo aparece quando ele é visto como fim em si mesmo.

Temos muitas ofertas para o corpo: ginásticas, academias, cosméticos, bioenergéticas, yoga, dança, expressão corporal, cirurgias plásticas, implantes, massagem...

Cuidar sim, idolatrar não; é preciso caminhar para a superação do medo do corpo, mas sem idolatrá-lo.

O corpo se plenifica na comunhão com outros corpos, com Deus e com o corpo da natureza. Nosso humilde corpo é parte da Criação inteira e nosso bem-estar faz sorrir a natureza.

Nosso corpo é pura relação. Nele ficam registradas todas as marcas de nossa vida, de nossa história.

A pele é a memória mais fiel de tudo o que nos acontece externamente.

O corpo é presença e linguagem - tudo nele fala: fala o rosto, falam os olhos, falam os movimentos e as posturas, falam os gestos, acompanhando, reforçando e expressando a intenção íntima.

É no corpo que o eu da pessoa historicamente se constitui em relação aos outro e às suas escolhas.

E a relacionalidade expressa pelo corpo não deve ser compreendida só em uma dimensão horizontal; essa se entrelaça com uma relacionalidade de tipo vertical que a fundamenta e a caracteriza em direção do Absoluto.

Texto bíblico: Jo. 6,51-58

Na oração: Nosso corpo é tocado pela encarnação de Jesus. E lembre-se de que Deus conhece nossa estru-

tura. Ele sabe de que barro somos feitos.

Reze sua humanidade, seu corpo de homem ou mulher. Leve para sua oração os desafios do coti- diano, os imprevistos da vida.

Seja humano diante de Deus, deixe seu corpo falar a Deus.

Reze com seu corpo. E agradecido(a) bendiga sempre o Senhor.


Texto Pe.Adroaldo

Sustentabilidade: adjetivo ou substantivo?




As empresas, em sua grande maioria, só assumem a responsabilidade socioambiental na medida em que os ganhos não sejam prejudicados e a competição não seja ameaçada. Chegamos a um ponto em que não temos outra saída senão fazer uma revolução paradigmática, senão seremos vítimas da lógica férrea do Capital que poderá nos levar a um impasse civilizatório

É de bom tom hoje falar de sustentabilidade. Ela serve de etiqueta de garantia de que a empresa, ao produzir, está respeitando o meio ambiente. Atrás desta palavra se escondem algumas verdades mas também muitos engodos. De modo geral, ela é usada como adjetivo e não como substantivo.Explico-me: como adjetivo é agregada a qualquer coisa sem mudar a natureza da coisa. Exemplo: posso diminuir a poluição química de uma fábrica, colocando filtros melhores em suas chaminés que vomitam gases. Mas a maneira com que a empresa se relaciona com a natureza donde tira os materiais para a produção, não muda; ela continua devastando; a preocupação não é com o meio ambiente mas com o lucro e com a competição que tem que ser garantida. Portanto, a sustentabilidade é apenas de acomodação e não de mudança; é adjetiva, não substantiva.Sustentabilidade, como substantivo, exige uma mudança de relação para com a natureza, a vida e a Terra. A primeira mudança começa com outra visão da realidade. A Terra está viva e nós somos sua porção consciente e inteligente. Não estamos fora e acima dela como quem domina, mas dentro como quem cuida, aproveitando de seus bens mas respeitando seus limites. Há interação entre ser humano e natureza. Se poluo o ar, acabo adoecendo e reforço o efeito estufa donde se deriva o aquecimento global. Se recupero a mata ciliar do rio, preservo as águas, aumento seu volume e melhoro minha qualidade de vida, dos pássaros e dos insetos que polinizam as árvores frutíferas e as flores do jardim.Sustentabilidade, como substantivo, acontece quando nos fazemos responsáveis pela preservação da vitalidade e da integridade dos ecossistemas. Devido à abusiva exploração de seus bens e serviços, tocamos nos limites da Terra. Ela não consegue, na ordem de 30%, recompor o que lhe foi tirado e roubado. A Terra está ficando, cada vez mais pobre: de florestas, de águas, de solos férteis, de ar limpo e de biodiversidade. E o que é mais grave: mais empobrecida de gente com solidariedade, com compaixão, com respeito, com cuidado e com amor para com os diferentes. Quando isso vai parar?A sustentabilidade, como substantivo, é alcançada no dia em que mudarmos nossa maneira de habitar a Terra, nossa Grande Mãe, de produzir, de distribuir, de consumir e de tratar os dejetos. Nosso sistema de vida está morrendo, sem capacidade de resolver os problemas que criou. Pior, ele nos está matando e ameaçando todo o sistema de vida.Temos que reinventar um novo modo de estar no mundo com os outros, com a natureza, com a Terra e com a Última Realidade. Aprender a ser mais com menos e a satisfazer nossas necessidades com sentido de solidariedade para com os milhões que passam fome e com o futuro de nossos filhos e netos. Ou mudamos, ou vamos ao encontro de previsíveis tragédias ecológicas e humanitárias.Quando aqueles que controlam as finanças e os destinos dos povos se reúnem, nunca é para discutir o futuro da vida humana e a preservação da Terra. Eles se encontram para tratar de dinheiros, de como salvar o sistema financeiro e especulativo, de como garantir as taxas de juros e os lucros dos bancos. Se falam de aquecimento global e de mudanças climáticas é quase sempre nesta ótica: quanto posso perder com estes fenômenos? Ou então, como posso ganhar comprando ou vendendo bônus de carbono (compro de outros países licença para continuar a poluir)? A sustentabilidade de que falam não é nem adjetiva, nem substantiva. É pura retórica. Esquecem que a Terra pode viver sem nós, como viveu por bilhões de anos. Nós não podemos viver sem ela.Não nos iludamos: as empresas, em sua grande maioria, só assumem a responsabilidade socioambiental na medida em que os ganhos não sejam prejudicados e a competição não seja ameaçada. Portanto, nada de mudanças de rumo, de relação diferente para com a natureza, nada de valores éticos e espirituais. Como disse muito bem o ecólogo social uruguaio E. Gudynas: "a tarefa não é pensar em desenvolvimento alternativo, mas em alternativas de desenvolvimento”.Chegamos a um ponto em que não temos outra saída senão fazer uma revolução paradigmática, senão seremos vítimas da lógica férrea do Capital que nos poderá levar a um fenomenal impasse civilizatório.


Leonardo Boff é teólogo e escritor.

domingo, 19 de junho de 2011

Dia Mundial do refugiado - Estatuto gera conflito no acolhimento de haitianos

Camila Maciel
Jornalista da Adital

"Depois de um ano e meio do terremoto (no Haiti), mais de um milhão de pessoas seguem vivendo em campos de desabrigados (...). Isso, provavelmente, provocou um aumento notável da migração para América Latina”, a afirmação é da ONG Entreculturas e do Serviço Jesuíta a Refugiados (SJR). Ela descreve uma prática que tem pelo menos três mil anos: o acolhimento de refugiados em terras estrangeiras. Tal prática será lembrada no próximo dia 20, com o Dia Mundial dos Refugiados, estabelecido pelas Nações Unidas em 2001.

O devido acolhimento, no entanto, não está acontecendo de forma pacífica nos países que recebem os haitianos. Entreculturas e SJA criticam a ambiguidade que manifestam os governos na hora de aplicar o Estatuto do Refugiado, o qual foi aprovado na Convenção de Genebra em 1951. "Essas pessoas seriam ‘refugiados’ ou ‘migrantes econômicos’?”, questiona a ONG. Diante dessa dúvida, as autoridades evitam oferecer assistência e proteção, ao mesmo tempo em que endurecem suas políticas migratórias para blindar suas fronteiras.

O Estatuto estabelece que refugiado é alguém que "temendo ser perseguido por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país”.

Nesse sentido, de acordo com a Agência das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), refugiados e migrantes, mesmo que viajem da mesma forma com frequência, são fundamentalmente distintos. Por essa razão, são tratados de maneira muito diferente perante o direito internacional.

É essa "interpretação restritiva”, de acordo com Entreculturas e SJA, que está gerando dificuldade para o acolhimento dos haitianos. Nas proximidades do Dia Mundial do Refugiado, esse impasse vem resultando em violações relevantes aos direitos humanos dessa população, como o tráfico de pessoas. Seduzidos por falsas promessas de estudo e trabalho, haitianos são vítimas de redes de tráfico durante seu trânsito a outros países.

A organização Anistia Internacional (AI), por sua vez, manifesta outra interpretação para o Estatuto. Ela também reconhece como refugiados, pessoas que tomam a difícil decisão de deixar seus lares diante de situações de "guerra, perseguição, desastres ambientais, pobreza”, dentre outras razões.

"As pessoas refugiadas deixam seu país porque não lhes resta outra opção e porque temem por sua vida, sua segurança ou por sua família. Também fogem (...) quando seu governo não quer ou não pode protegê-las de graves abusos contra os direitos humanos”, explica AI. Terremoto, epidemia de cólera, passagem de furacões são situações vivenciadas no Haiti, que provocam a fuga e a busca por um novo futuro.

Atividades no Dia Mundial do Refugiado

O dia 20 de junho será marcado por diversas atividades pelo mundo. As Nações Unidas trabalham este ano com a Campanha "Vamos calçar os sapatos dos refugiados e dar o primeiro passo para entender sua situação”. Como parte da Campanha, a ACNUR apresentará o relatório ‘Tendências Globais 2010’, com as últimas estatísticas mundiais sobre asilo e refúgio.

Também no dia 20, a Anistia Internacional realiza um ato na Praça das Armas, em Santiago do Chile, a partir das 20 horas. O objetivo é mostrar imagens e testemunhos de maneira a expor a grave situação de refugiados no mundo.

No México, a organização Iniciativa Cidadã para a Promoção da Cultura do Diálogo realiza um Festival Cultural, de 16 a 26 de junho, com propósito de "mostrar o grande valor e contribuições das pessoas refugiadas no México, animando a população a exercer o respeito e a solidariedade”, diz a nota de divulgação.

Santíssima Trindade: Deus é Um, mas não está só


“No princípio está a comunhão dos TRÊS e não a solidão do UM” (L. Boff)

“Já se disse, de forma bela e profunda, que nosso Deus em seu mistério mais íntimo não é uma solidão mas uma família, pois que leva em si mesmo a paternidade, a filiação e a essência da família que é o amor; este amor, na família divina, é o Espírito Santo” (João Paulo II, Puebla, 1979)

Quando os cristãos professam que Deus é Trindade, PAI, FILHO e ESPÍRITO SANTO não estão somando números 1+1+1=3. Se houver número então Deus é um só e não Trindade.

De fato, o Pai, o Filho e o Espírito Santo não são partes de Deus. Os três unidos não constituem Deus. Mas cada um é Deus. Cada um não somente tem, mas é a natureza divina, a divindade, toda a divindade.

O Pai é toda a divindade, enquanto nascente, doada. O Filho é essa mesma divindade, enquanto recebida. E o Espírito Santo também é toda a divindade, enquanto compartilhada, comunicada, doada.

Com a Trindade, nós cristãos não queremos multiplicar Deus. O que queremos é expressar a experiência singular de que Deus é comunhão e não solidão.

Numa correta compreensão da fé cristã não podemos dizer que primeiramente Deus é UNO e depois se desdobra ou aparece como TRINO, quer dizer, como Pai, Filho e Espírito Santo. O que se professa é que Deus desde sempre foi, é, e será Pai, Filho e Espírito Santo.

Como combinar estas duas proposições: Deus é TRINO sem deixar de ser UNO?

Devemos partir do fundamental da experiência cristã de Deus: na história de Jesus, na sua oração, na sua prática de libertação, na sua ressurreição... mostrou-nos que existe o Pai, o Filho e o Espírito Santo.

Para se entender como os três podem ser UM e o ÚNICO Deus, devemos considerar as relações que vigoram entre os três.

Deus-Trindade é, portanto, a relacionalidade por excelência; total relacionalidade de cada uma das pessoas divinas com respeito às outras, de tal forma que se implicam e incluem reciprocamente sempre e em cada momento, sem que uma seja a outra.

Deus só existe como ser em relação. A grande novidade cristã é que a divindade só existe comunicada, parti-lhada. Deus é relação. Deus é só relação. Deus é só amor. “No princípio está a relação” (G. Bachelard).

É por ser o próprio Deus essencialmente relação que essa relação, “num belo dia”, num transbordamento de vida, num transbordamento de gratuidade, pôde abrir-se a nós para nos fazer existir, concedendo-nos ser e convidando-nos a essa relação com Ele.

É por ser Deus diálogo, conversação desde sempre com o Filho e o Espírito, que Ele pôde empreender o propósito de dialogar conosco. Seu relacionamento para conosco desvenda, deixa entrever o dinamismo das eternas relações entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo, dinamismo no qual elas têm origem e do qual nos convida a participar.

As TRÊS PESSOAS DIVINAS não estão uma ao lado da outra; elas estão voltadas umas às outras.

Cada PESSOA é PARA a outra, PELA outra, COM a outra e NA outra.

Se o PAI existe em si, é para poder se entregar totalmente ao FILHO, que por sua vez, comunga plenamente com o PAI. Ambos, como num só movimento doam-se completamente ao ESPIRITO SANTO, e este a eles. No princípio está, portanto, a comunhão dos três. Esta comunhão tão perfeita fundamenta a UNIDADE das Três Pessoas. Só Deus é Deus, mas Ele não está só. Deus não é solitário. Deus é, por natureza, vida doada, partilha, relação, comunicação, ânsia de comunhão.

Assim, o PAI está todo no FILHO e todo no ESPÍRITO SANTO; o ESPÍRITO SANTO está todo no PAI e todo no FILHO; o FILHO está todo no PAI e todo no ESPÍRITO SANTO.

O PAI é único e não há ninguém como Ele; o FILHO é único e não há ninguém como Ele; o ESPÍRITO SANTO é único e não há ninguém como Ele. Cada um é único.

Os Únicos se relacionam entre si tão absolutamente, se entrelaçam de forma tão íntima, se amam de maneira tão radical que se uni-ficam, isto é, ficam Um.

Para a fé cristã, portanto, só Deus é Deus, mas Deus não está sozinho. No próprio Deus há lugar para a alteridade, a fim de que haja oportunidade para o dom e a partilha, para a comunhão. O próprio Deus é dom e partilha, de tal sorte que tudo o que vem dele, tudo o que Ele cria gratuitamente, também é marcado pela chancela da gratuidade, do desejo do outro e do dom de si. Desde toda a eternidade, Deus só é Deus comunicando-se, Deus só é Deus doando-se.

TODOS são igualmente eternos, infinitos e amáveis, em comunhão sem princípio e sem fim. As Pessoas divinas são, desde toda a eternidade, Pessoas-comunhão. Então, há um só Deus-comunhão-de-Pessoas.

"Deus é UM, mas não está jamais só."

Ele é sempre Trindade, comunhão de Três Pessoas divinas, pelas quais circula toda a torrente de Vida Eterna.

Cada PESSOA divina é distinta para poder se entregar e fazer-se dom para a outra.

Assim, encontramos no mistério da TRINDADE o modelo perfeito da co-existência da multiplicidade com unidade. A diferença (o Pai não é o Filho, nem o Filho é o Pai, nem o Espírito Santo é o Pai e o Filho) não funda uma divisão, mas deixa emergir a riqueza de uma unidade plural.

Ora, tal Mistério fonte de todo ser, constitui o modelo ideal de todo e qualquer convívio humano. Somos feitos à “imagem e semelhança da Trindade”. Trazemos em nós impulsos de comunhão.

Sempre que construirmos relações pessoais e sociais que facilitem a circulação da vida, a comunhão de diferentes à base da igualdade, estaremos tornando visível um pouco do mistério íntimo de Deus.

Deus quer inserir-nos nesta sua COMUNHÃO, como no-lo disse Jesus: "Que todos sejam um como Tu, Pai, estás em mim e eu em Ti, para. que eles estejam em nós, e o mundo creia que Tu me enviaste" (Jo. 17,21).

A glória de Deus é a COMUNHÃO dos homens.

Se nós não somos COMUNHÃO de pessoas, não somos IMAGEM de Deus que é CO-MUNHÃO de pessoas.

O ser humano só é autenticamente humano na relação. Porque Deus é relação.

Aqui a luz da revelação trinitária vem iluminar e confirmar a intuição de que o ser humano pode ter de si mesmo: existir realmente não é existir só para si, é “ex-istir”, sair de si mesmo, assumindo o risco de perder-se para reencontrar-se no outro e com o outro. Em Deus, o Deus de Jesus Cristo, descobrimos que o ser é relação, que a pessoa é relação.

Como homem e como mulher trazemos esta força interior que nos faz “sair de nós mesmos” e criar laços, construir fraternidade, fortalecer a comunhão.

- o ser humano não é feito para viver só; ele é chamado a viver em comunhão com todas as pessoas;

- ele necessita com-viver, viver-com-os-outros;

- é essencial descobrir o sentido e a vivência da relação com os outros, da fraternidade...

- o sentido da vida em comum é um dom de Deus, que nos foi dado a todos.

Deus nos fez amor para o mútuo encontro, para a doação, para a comunhão...

Fomos criados “à imagem e semelhança” do Deus Trindade, comunhão de Pessoas (Pai-Filho-Espírito Santo). Quanto mais unidos somos, por causa do amor que circula entre nós, mais nos parecemos com o Deus Trindade. “Se nos amarmos uns aos outros, Deus permanece em nós e o seu Amor em nós é perfeito” (1Jo. 4,12)

Deus colocou em nossos corações impulsos naturais que nos levam em direção ao convívio, à coopera-ção, à acolhida, à solidariedade... “Só corações solidários adoram um Deus Trinitário”.

Texto bíblico: Col. 3,12,17 Jo. 14,22-26

Texto de Pe.Adroaldo

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